Já estive várias vezes na Madeira mas nunca tinha feito uma levada – canais de irrigação construídos a partir do séc. XVI que se deviam à necessidade de trazer água das vertentes da ilha orientadas a Norte, onde abunda, para o lado sul da ilha, de mais fácil habitação e onde se situaram desde sempre a maioria das plantações. Assim decidi que desta vez iria fazer uma caminhada por dia para descobrir estes caminhos pelas montanhas.
Durante a pesquisa identifiquei, para além das levadas, algumas veredas que gostaria de fazer, pelo que a minha selecção foi a seguinte:
Uma das levadas mais famosas e concorridas é a Levada das 25 Fontes. Para a do Alecrim deixamos o carro no mesmo sítio, seguimos as setas que indicam PR6.2 e onde quase não encontramos ninguém. Foi a minha amiga Soraia que me sugeriu fazê-la, pois a minha ideia original era fazer a famosa. E que boa sugestão! A levada em si não é tão extraordinária como a que fiz no dia quatro, mas na altura ainda não sabia, por isso pareceu-me maravilhosa. Mas o mais impressionante é mesmo a enorme cascata para a Lagoa do Vento, onde fiquei bastante tempo a observar o poder da natureza, sozinha! A única dificuldade é voltar a subir tudo para chegar à “nascente” da Levada do Alecrim (algo equivalente a 90 andares) onde encontramos mais uma cascata. Depois há que regressar ao ponto de partida. Durante a levada e já longe das cascatas é possível parar e não ouvir absolutamente nada, silêncio completo, enquanto apreciamos as montanhas madeirenses!
A que mais gostei de fazer e a mais difícil que fiz. Talvez uma coisa influencie a outra, pois faz sempre bem ao ego chegarmos ao fim do dia e darmo-nos conta que conseguimos subir algo como duzentos e trinta andares para chegar ao ponto mais alto da Madeira. Cheguei ao Pico do Areeiro por volta das dez da manhã e não se via um palmo à frente. Decidi esperar um pouco e ver se alguém se aventurava primeiro pois não seria boa ideia ir sozinha, caso algo acontecesse não teria ninguém para me ajudar ou socorrer. Depois de meia hora vi duas raparigas que estavam igualmente receosas pela situação atmosférica, mas decidimos arriscar, até porque pouco depois encontrámos um senhor em sentido contrário que nos avisou que aquela ventania era só naquela parte inicial. Elas, uma polaca e uma turca que viviam na Alemanha, fizeram o caminho todo comigo, felizmente andávamos ao mesmo ritmo, algo muito importante nestas andanças. A vereda tem vistas incríveis, túneis escuros, e a última hora é de muitas escadas, aspecto que nos desalenta até chegarmos ao topo, acima das nuvens, e ganharmos um boost de energia incrível! Considerámos voltar a pé para trás mas achámos que era melhor não e fomos até à Achada do Teixeira, lugar a apenas 2km onde os carros chegam, e onde o pai da Soraia amavelmente nos foi buscar. Digo amavelmente porque para voltar ao Pico do Areeiro, onde tinha deixado o carro, é uma hora de caminho.
Esta é uma levada com mais gente pois há autocarros em ambas as pontas do percurso. Também eu fui de transportes públicos pois nos dias anteriores andei com o carro da Soraia mas neste dia ela precisava dele. Assim tomei o autocarro das 10h da manhã do Funchal para o Ribeiro Frio (tão concorrido que tiveram de fazer um autocarro extra para levar todos os turistas). Fiz primeiro a Vereda dos Balcões, uma caminhada de apenas 1,5km para cada lado para um miradouro com vista para o bloco montanhoso central onde tinha caminhado no dia anterior. Já tinha visto fotografias fabulosas deste miradouro, pelo que a luz daquela hora me desapontou um pouco. De regresso ao Ribeiro Frio comprei um prego no bolo do caco para levar no Faísca, um lugar conhecido precisamente por este manjar, antes de começar a Levada do Furado. Esta levada foi a menos bonita que fiz e onde me senti mais sozinha, pois a onda de turistas tinha arrancado assim que chegou ao Ribeiro Frio, sem antes passar pelos Balcões. Só depois da metade é que começou a ficar mais interessante, quando encontrei os “furados”, mini túneis escavados na rocha. A levada termina no miradouro da Portela e os últimos dois quilómetros, a descer, são bastante desinteressantes, é já só aquele sentimento de “está quase!”. Aí temos também um autocarro que nos leva de volta ao Funchal.
Esta é também uma das levadas mais conhecidas e sem dúvida uma das mais bonitas. São 6,5km para cada lado, sendo que o regresso foi feito em metade do tempo que a ida pois instalou-se um nevoeiro que não nos deixava ver nada. Recomenda-se levar uma lanterna, pois tem túneis bastante compridos e absolutamente escuros, e não olhar só para o chão mas também para o tecto pois há partes bastante baixas (e pela amostra – desta vez já tive companhia – 3 em 4 pessoas batem com a cabeça… com força…). Todo o percurso é lindíssimo e termina com uma incrível cascata, no tal Caldeirão Verde, uma antiga cratera vulcânica. Aconselha-se levar um agasalho pois o Caldeirão é bastante fresco e se gostam de parar e absorver toda esta energia da natureza, convém estar confortavelmente abrigados.
Da última vez que vim à Madeira como turista visitei a Ponta de São Lourenço e, apesar da ventania, fiquei cheia de vontade de alcançar a ponta mais oriental da ilha da Madeira. Deixei esta caminhada para o último dia também por ser a que ficava mais perto do aeroporto, para onde corri assim que a acabei (ou que acabei a correr para apanhar o voo a horas). Esta parte da ilha tem uma vegetação muito diferente, devido precisamente aos ventos que se fazem sentir, mas que naquele dia não se faziam, logo passei um calor danado. Tem também das águas mais cristalinas que já vi, bastante convidativas quando a temperatura do ar estiver meia dúzia de graus mais alta. Segundo a Soraia é também muito interessante de fazer ao longo do ano pois as cores vão mudando muito, desde as várias flores na primavera aos tons mais secos de Verão – embora nessa altura seja horrível de se fazer pois não há uma única sombra. Desde Agosto que há um bar de apoio na Casa do Sardinha, imediatamente antes da grande subida que nos leva a ver a ponta das pontas, uma ilhota já destacada da ilha da Madeira e, por isso, de impossível acesso. É também daqui que se pode ver ambas as costas sul e norte da ilha e por aqui passa a rota aérea, pelo que do avião se conseguem fotografias bastante bonitas da ponta, para fechar as cinco caminhadas em beleza!
No total fiz 56,5km, passei 19h45 a caminhar, subi 476 andares num somatório de 77500 passos!
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