Eu não costumo ver as notícias, pelo que a primeira vez que ouvi falar do vulcão de La Palma foi já duas ou três semanas depois de ter começado a erupção, devido às notícias referentes aos “negacionistas do vulcão”. No início de Outubro fui visitar o meu amigo José a Saragoça e ele, sim, via sempre o telejornal, pelo que de repente, e para mais estando em Espanha, fui inundada por imagens de um espectáculo natural, uma erupção explosiva, que estava a acontecer não muito longe! Decidi que tinha de ir a La Palma, ver o Cumbre Vieja com os meus próprios olhos, sentir o poder da natureza na sua forma mais pura e creadora! Já em Lisboa, procurava as livecams no YouTube e adormecia a ver aquelas imagens!

Mas já tinha uma viagem marcada para o Luxemburgo e França, pelo que a visita a La Palma só se concretizaria um mês depois de ter regressado da minha viagem com o José, que passou ainda por Tarazona, Teruel e Cuenca.

A 11 de Novembro voei com a Ryanair para Tenerife Sul, onde cheguei já o sol de tinha posto. Dormi uma noite num hostel manhoso em Los Cristianos e na manhã seguinte apanhei o ferry para Santa Cruz de La Palma. O ferry é todo fechado, pelo que as vistas a sair de Tenerife, a passar pela ilha de La Gomera, e finalmente a chegar a La Palma não eram as mais fáceis de fotografar.
Chegada a Santa Cruz, apanhei o autocarro para Los Llanos de Aridane, onde tinha alugado um quarto. Muita gente não sabe que se pode visitar La Palma, mas o governo até promove o turismo, para diminuir o impacto económico que a ilha está a sofrer. Em Santa Cruz nem nos dávamos conta que havia um vulcão em erupção na ilha. Havia algumas cinzas vulcânicas no estacionamento do porto, mas que poderia ser facilmente confundido com um pouco de areia preta ali deixada por acaso (os ventos predominantes são para o lado oposto à capital, pelo que as cinzas não costumam ali chegar).
Quando finalmente vi a cratera do Cumbre Vieja, quase a chegar a El Paso, percebi que nesse dia o vulcão estava bem calminho, não se podendo comparar com as imagens que tinha visto na televisão. Ainda assim era bastante impressionante ver as ruas cheias de cinzas e principalmente a fronteira do que tinha sido atingido pela lava, com casas meio “comidas”.

Deixei a mochila no Airbnb, uma casa colonial mesmo no centro de Los Llanos, dei um pequeno passeio por esta bela localidade, enquanto vários locais limpavam as ruas e as casas, das cinzas e eu esperava pelo autocarro (que só havia a cada 30/60min). Fui então para o Miradouro da Igreja de Tajuya, dos melhores sítios para se ver o vulcão e onde costuma estar a comunicação social. De aí conseguia-se ver um pouco de lava a descer a encosta, fumo e gases a sair da cratera, mas realmente nada de especial, não havia sequer cinzas no ar, pelo que estava um pouco decepcionada. A notícia do dia era que uma segunda fajã se estava a criar (que mais tarde se uniu à primeira), mas que não era possível ver desde nenhum lado da ilha, acessível por civis. Para não me sentir tão decepcionada, ia fotografando as ruas cheias de cinzas.

Mas eu tinha um plano e uma missão! Nos preparativos para a viagem pus-me em contacto com vários fotógrafos que tinham imagens incríveis do vulcão e foi através deles que soube que poderia ser possível voar o drone, caso pedisse autorização ao PMA (Puesto de Mando Avanzado), a autoridade que geria tudo o que é polícia, bombeiros, militares, etc. Mas cheguei a La Palma sem saber onde encontrá-los.
 
Uma das páginas com quem tinha falado, a @dron_services_canarias, que estava a trabalhar directamente com o governo, tinha-me dito que eventualmente poderia voar com eles, mas depois deixaram de responder por vários dias… Subi a pé até um outro ponto onde a estrada estava cortada e que supostamente era o sítio mais perto da cratera, mas nem aí os guardas me sabiam dizer onde encontrar o PMA… Estava a perder as esperanças! Fui até El Paso e, durante o almoço, mandei mensagem a um outro rapaz com quem também já tinha contactado, o @daviddelrosariophoto que me disse então onde os poderia encontrar: em El Paso, perfeito!
 
Entrei pelo portão onde dizia “Solamente personal autorizado” com toda a confiança, cheguei ao edifício e disse que estava ali para conseguir a autorização para vôo com drone, o segurança até ficou meio desorientado mas de repente passa um rapaz e ele pede-lhe que chame a não sei quantas. Quando esse rapaz entra no edifício eu vejo que ele está com um colete da @dron_services_canarias! Desce uma rapariga, explica-me que lhe preciso de enviar não sei quantos documentos (e eu a ver a minha vida a andar para trás, porque não tinha esses documentos comigo, nem sabia bem onde os tinha, pelo que não seria fácil pedir ao Jorge, em casa, que os procurasse no computador), e que há uma lista de espera, aí aviso que só estaria na ilha até ao dia seguinte, o que complicava ainda mais a coisa… Ela vai-se embora, e nesse momento recebo uma mensagem dos @dron_services_canarias a dizer que já têm a “tripulação” cheia e que infelizmente não me iam poder incluir. Vou-me  dirigindo à porta a passo lento, já à procura dos documentos no e-mail, e recebo outra mensagem no Instagram: “Espera! No te vayas“. Tinham percebido que eu, @images_from_my_world, era a miúda que estava à porta a tentar ter uma autorização de vôo!
 
Passado uns minutos desce o Eduardo, sempre com o colete da @dron_services_canarias, e diz-me que eles vão sair para voar dentro de meia hora e que precisam dos meus dados para eu ir com eles. Nem podia acreditar!!! Não só ia poder voar o drone, como ia poder entrar na zona de exclusão, como parte integrante da equipa que recolhe imagens para os vulcanólogos do governo! Diz-me também que na verdade não iam dar mais autorizações de vôo a civis, que a rapariga teve pena de mim e que foi aí que se fez o click e ele percebeu quem eu era! Ofereceu-me um boné com o logo deles, emprestou-me um colete e explicou-me as regras: não me poderia comportar como jornalista. Tive de lhe perguntar o que era isso, pois não era jornalista – não podia afastar-me muito deles, não podia parecer que estava ali para fotografar as autoridades a trabalhar e devia seguir todas as indicações que eles me davam. Claro que sim, bora!
 
Uns minutos depois chegaram o Jonathan (@crazy.gravity), o Samuel (@samu_bali) e um outro rapaz e fomos então para a zona de exclusão, precisamente pela estrada cortada onde eu tinha perguntado onde era o PMA. Cada vez mais cinzas vulcânicas na estrada, até que chegámos à lava, já petrificada. Não podia acreditar na minha sorte, de poder ali estar!
 
Chuviscava, tínhamos de esperar para poder levantar o drone, mas podia ir tirando fotos desde o chão, da lava, das casas que ficaram a escassos metros de ser engolidas, mas cobertas de cinzas, deles a trabalhar, a ouvir as histórias de quem acompanha o vulcão desde o dia 19 de Setembro, quando tudo isto começou! Estava muito vento, os gases expelidos pelo vulcão quase nem subiam, sendo imediatamente arrastados para oeste, tinha medo de voar mas não podia não o fazer.

A chuvinha acalmou e eu voei! E que vôo! Desde o ar podiam-se ver os rios de lava, que ficavam mais e mais brilhantes à medida que o sol se aproximava do horizonte. Podiam-se também ver casas que tentavam emergir da lava, num último suspiro. Árvores sobreviventes, um barco militar ao fundo, que acompanhava a criação da nova fajã. Infelizmente, como estava muito vento, eu não me podia aventurar muito, com o risco de ficar sem o drone, que tinha de vir contra o vento de “volta a casa”, mas ainda assim foi dos voos, das imagens, dos dias mais incríveis da minha vida!

Entretanto o sol pôs-se e começou outro espectáculo! A lava no chão pintava as nuvens de laranja e de vermelho e finalmente se podia ver que durante todo o dia, embora não parecesse, da cratera saíam piroclastos e que a lava estava ali mesmo, a borbulhar.
 
Ia conversando também com o Samuel, um de tantos milhares que perdeu a sua casa para o vulcão. Contou-me da injustiça dos seguros e dos bancos, contou-me que estava numa casa de família, a viver com mais 12 pessoas, contou-me também de como a situação foi mal gerida, de que as autoridades sempre disseram que nunca ia atingir a sua vila (La Laguna) e de repente só lhes deram uma hora para sair de casa. Ainda assim, ele não deixava de olhar para o vulcão como um espectáculo de uma enorme beleza! E que sentia-se sortudo por poder vivenciar esta erupção, já que a actividade vulcânica está presente nos contos e nas canções típicas do arquipélago, mas que não toca a todas as gerações assistir de facto a uma erupção!
Apareceram alguns trabalhadores a distribuir comida para quem estava ali de serviço, pelo que até direito a jantar grátis tive! Comemos todos juntos e depois eles deixaram-me no miradouro de Tajuya, de onde, por mais um pouco, agora de volta ao mundo dos civis, pude admirar os rios de lava a descer a encosta e a pintar o céu de vermelho!

No dia seguinte acordei às 6h56 da manhã com o quarto todo a tremer! Nem podia acreditar que também tinha podido sentir um terramoto, algo que sempre tive curiosidade! Foi muito rápido, tipo dois segundos, a cama abanou na horizontal e acabou. Na altura fiquei feliz e ao mesmo tempo um pouco ansiosa, já que não sabia se devia ficar deitada na cama ou ir para algum lugar “mais seguro”. Ouviu os hóspedes do outro quarto irem à casa de banho, estavam também eles relaxados, pelo que decidi voltar a dormir. Quando acordei descobri que tinha sido um terramoto de magnitude 5, na escala de Richter.

Quando saí, o vulcão estava igualmente calmo, pelo que optei por ir visitar um pouco da ilha, já que é conhecida por Isla Bonita, subindo ao miradouro de La Cumbrecita e visitando a cidade de Santa Cruz de La Palma, motivos para um futuro post.